quinta-feira, 10 de março de 2016

O estereótipo abominável

Acabo então por chegar a esta breve conclusão, a de que a vida é gerida por um destes dois fios condutores: necessidade ou hábito, a que podemos de igual forma denominar comodismo.

- C.M, P.4
A primeira criatura que me chama assim. Bom, ela sempre adorou irreverências. Pernas erguidas, oito lances de degraus, meia dúzia de engravatados com ar altivo. Bato à porta e o Esteves passa o cartão
- Olha! Outra pobrezinha... Esta juventude não vai de mal a pior, vai do pior ao execrável.
Miro-os a todos e de todos tenho pena, até do Esteves. Nem dinheiro tem para aparar o bigode. Pobre que é pobre partilha a pobreza e a entreajuda é coisa que se aprende desde pequeno. Dou um toque à J. e ela rapidamente resolve a questão, é limpinho.

A porta aberta antevia a conversa...
- Oh J., por cá?- como se nos tivéssemos cruzado por mero acaso.
- Pois então, como está a peste?
- Fantástica, não se nota? O mesmo não poderei dizer do Esteves... O raio do homem insiste em preservar aquele aspeto carrancudo.
- Só tu para me fazeres rir numa hora e sítio destes. Também insistes em preservar o teu bom sentido de humor!
- Vou fazendo por mantê-lo. Mas olhe que não é tarefa fácil, admito. Ainda não há menos que um quarto de hora aborreci-me com uma situação. Não me aborreci, fiquei desiludida. Sabe como funciona o mundo da linguagem tão bem quanto eu. Deveras chego a crer que se deveria começar a ensinar qualquer coisa como Dialetos Lusitanos ao invés do Português. Pense comigo: seria bem mais atrativo, dado que se iria somente dar continuidade a uma aprendizagem de uma disciplina que nunca existiu mas que inevitavelmente toda a gente absorveu. Não andarão os professores e o ministério equivocados nesta questão? Estaríamos a formar, claro está, ignorantes. Contudo, uns ignorantes felizes. Quem é feliz numa aula de português? Bom, o que eu ouvi foi o seguinte. Não importa de que boca imunda surgiu esta/este... (Não existem adjetivos.) Convém sublinhar apenas ter sido este discurso emitido por um senhor que a priori tem o mínimo do chamado bom senso

- Detesto gripes, fod****. Manda-me bué abaixo. 'Tás a ouvir? (...) A enfermeira Maria... Lá dentro. O cigano é que disse à gente. Ya, cortar o rabo de cavalo, o gajo. Olha quem é ele! Já não ligas aos pobres pá? Isto aqui é o cantinho da saudade pá? Senta aqui... Tudo bem? (...) É verdade, viva ao campeão. Ganhámos é o que interessa. Jogou da maneira suficiente para ganhar é o que interessa. Se jogou grande pequenino não interessa. Dá aí um cigarrinho dos teus, vamos lá para fora masé. (...) Porra, o Patrício não tinha hipótese nenhuma. Agora o Cassilas!


C.V. 11/03/16




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