sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Partilhámos a mesma casa durante meia década, lá na aldeia.
Felícia vivia no rés-do-chão. Separavam-nos aqueles intermináveis nove degraus, que tinha tanta dificuldade em subir. Cada erguer de perna uma dor que nunca descobri, uma dor que nunca me contou. Pudesse eu ter transportado essa dor debaixo do braço na altura e talvez ainda Felícia cá permanecesse.
O seu percurso de vida sempre me maravilhou. Rotineiramente nos sentávamos nas escadas que davam acesso ao terraço onde Felícia estendia a roupa. Contava-me as histórias da sua juventude, passada em Lisboa, de um amor que não fora correspondido e das peripécias ocorridas na maternidade Alfredo da Costa, local onde trabalhou. Falava-me com olhos doces, uns olhos de um castanho cor-de-avelã que nunca mais esquecerei. Cada palavra sua respirava saudade e os seus lábios tremiam até ao âmago sofredor.
Que saudades eu guardo dessas histórias deliciosas, como se de um chocolate se tratasse... Daqueles que se nos derretem na boca, sabe?

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